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In Pátio. Educação Infantil, n° 2,
agosto-novembro 2003, pp. 18-20.

 

 

 

 

 

 

 

Para educar crianças pequenas,
o bom senso não basta !

Philippe Perrenoud

Faculdade de Psicologia e Ciências da Educação
Universidade de Genebra
2003

A educação custa caro. Portanto, os governos procuram limitar os orçamentos destinados à educação. Sua forma de conceber a economia às vezes é absurda. Poderíamos escrever um livro arrolando todos os cortes orçamentários que produzem - em outros lugares ou mais tarde - despesas 100 vezes superiores. Um dos esquemas clássicos é esperar que os problemas se agravem para investir recursos. É o eterno dilema da prevenção : ela custa menos, mas deve ser imediata!

O tratamento médico-social e educativo da pequena infância é uma ilustração disso. Nem tudo acontece antes dos 6 anos : o ser humano é capaz de se desenvolver, de aprender, de mudar em todas as idades da vida. Entretanto, o que se constrói na pequena infância, sem ser irreversível, irá pesar muito na continuação da existência.

Na maioria dos países, as crianças das classes favorecidas dispõem, antes mesmo de nascer, de todos os recursos requeridos para otimizar seu desenvolvimento : alimentação rica e equilibrada, cuidados médicos de ponta, ambiente educativo, amor e atenção. A diferença entre países ricos e países pobres está na fração de cada classe de idade que tem acesso a esses privilégios.

Nos países desenvolvidos, a medicina também se desenvolveu na neonatologia e na pediatria. Ninguém contesta a importância de um encargo acentuado dos problemas de desenvolvimento neurológico e sensorial, de nutrição, nem a necessidade de uma detecção precoce das deficiências ou doenças invalidantes. Mesmo que os pediatras sejam os médicos especialistas mais mal pagos, ninguém pensa que basta confiar os recém-nascidos e as crianças pequenas aos especialistas em enfermagem, reservando a intervenção dos médicos às crianças com mais idade.

Contudo, é isso que acontece no campo da educação. Em vários países, os professores que atuam nos jardins de infância e nas escolas maternais são, ainda hoje, menos formados e mais mal pagos que seus colegas que trabalham no ensino obrigatório (Na Suíça, a escolaridade obrigatória consiste em um grau primário, iniciado por volta dos 6 anos de idade, que dura de 4 a 6 anos - variando conforme os cantões -, e um grau secundário, que dura de 3 a 5 anos. NdeT) As educadoras da pequena infância são, pelas mesmas razões, menos formadas e mais mal pagas que os educadores que se encarregam de pessoas deficientes ou mentalmente perturbadas.

Por quê? Será porque a vida das crianças pequenas teria menos valor? Não há mais, nos dias de hoje, uma explicação suficiente : o "sentimento da infância" se desenvolveu, mesmo que continue sendo, com muita freqüência, um luxo de país rico. Não, o motivo arranjado por aqueles que recusam meios à educação das crianças pequenas é a convicção de que as profissões da pequena infância são extensões da função materna, que requerem amor e tempo, mas nenhuma formação específica. Foi o que disseram por muito tempo a respeito dos cuidados em enfermagem, já que a abnegação das mães ou religiosas substituíam o especialismo, e o ato de cuidar parecia mais uma atitude humana do que uma competência baseada em saberes e capacidades.

É tempo de fazer a mesma atualização para a responsabilidade profissional da pequena infância. Poderíamos até estender o raciocínio à educação e aos cuidados assumidos pelos pais! Exige-se uma carteira de motorista para dirigir, ao passo que o direito de educar e instruir, cuidar e alimentar, recompensar e punir é concedido aos pais sem nenhuma condição prévia. Esse direito é retirado apenas após maus tratos duradouros ou gravíssimos. E isto ainda requer que haja identificação, intervenção e julgamento. Os trabalhadores sociais, psicólogos, cuidadores, professores, todos aqueles que estão em contato com crianças medem os danos acarretados por uma educação parental desastrosa e condenam a impunidade da maioria dos pais incompetentes ou irresponsáveis. Os profissionais que trabalham com adultos em sofrimento psíquico sabem que os problemas geralmente têm origem em uma infância infeliz.

Aparentemente, é preciso aceitar em deixar certas crianças nas mãos de pais incompetentes ou relapsos, sob pena de entrar em conflito com os direitos reconhecidos aos pais. Um controle maior representaria também uma forma de violência cultural, já que psicólogos, pedagogos, trabalhadores sociais e cuidadores imporiam suas normas aos pais de outras classes sociais.

Este é mais um motivo para dar aos educadores da pequena infância um nível elevado de formação. Afinal, sua missão é dupla : não apenas atuar adequadamente junto às crianças, mas difundir saberes educativos e psicológicos junto aos pais, fazer com que suas crenças e atitudes evoluam. A tarefa seria muito mais delicada se não pudesse ser conduzida a despeito das diferenças culturais e da dignidade dos pais.

Quanto ao trabalho com as próprias crianças, é hora de entender que a complexidade dos processos em jogo não é proporcional à idade das crianças. A pequena infância é um momento em que as estruturas fundamentais da pessoa são organizadas. Os erros educativos têm, portanto, conseqüências das mais graves.

Em se tratando de crianças pequenas, os processos envolvidos são, além disso, mais opacos, porque o principal interessado ainda não é capaz de participar plenamente da elucidação dos problemas ou da conduta de uma ação educativa. A um adulto que está chorando, podemos perguntar o que há de errado, o que o angustia ou por que está triste. Nada disso pode ser feito com uma criança pequena. O profissional da pequena infância deve, ademais, garantir a cooperação de pais às vezes ausentes, às vezes muito angustiados, desconfiados, paralisados ou agressivos.

Além disso, os problemas de desenvolvimento são, com mais freqüência ainda, de ordem sistêmica. Tudo se mantém : as dimensões fisiológicas, psicológicas, culturais, relacionais. Intervir junto a uma criança pequena é compreender a dinâmica familiar, ter uma representação das condições de vida, dos dados sanitários e dos hábitos alimentares.

Aos conhecimentos específicos, deve-se acresentar, portanto, uma certa polivalência. Será que notamos que um pediatra é um especialista das doenças de uma idade da vida ao passo que um outro especialista se concentra numa patologia específica? Não é por acaso : a criança é um todo, ao passo que a estruturação em papéis e compartimentos relativamente estanques caracteriza a vida adulta.

Insistimos muito hoje nos direitos da criança - e com razão - uma vez que têm sido amplamente ridicularizados : exploração do trabalho infantil, turismo sexual, violência dos adultos. Que essa causa justa não impeça o progresso do conhecimento dos processos de desenvolvimento e aprendizagem durante a primeira infância. Se vários dirigentes políticos, eleitores e funcionários podem, muitas vezes de boa fé, pensar que o bom senso é suficiente para educar as crianças pequenas, é porque não entenderam o que ocorre nos primeiros anos da vida, nem compreenderam o tamanho do especialismo que os educadores devem mostrar.

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© Philippe Perrenoud, Université de Genève.

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